Hoje em dia o bullying está na boca do mundo graças a corajosas vítimas que denunciam os agressores mas também devido às partilhas dos infelizes acontecimentos nas redes sociais. Nunca me vou esquecer dos vídeos que abriram os telejornais nem tão pouco vou esquecer das gargalhadas dos miúdos que de forma infantil, gravam esses vídeos dos seus pares a serem esbofeteados, pontapeados e agredidos.
É muito triste ver isso, e um dia dedicar-lhe-ei um tempinho aqui no blog, mas hoje quero falar de outra coisa – do bullying dos pais.
Já sabemos também pela comunicação social, sobretudo a mais sensacionalista, que há pais que batem nos professores, nos filhos, nos amigos dos filhos, mas também não vou falar desse bullying mais físico. Vou concentrar-me em duas vertentes: aluno(filho) e professor/educador.
Começando pelo mais óbvio, os nossos filhos. Consciente ou inconscientemente os pais projetam nos filhos os seus sonhos e, muitas das vezes a pressão psicológica (e em alguns casos física) serve para os condicionar as suas opções.
Ainda no decorrer deste ano letivo tive um aluno, o “José”, que quando lhe perguntava, para efeitos da mecânica de trabalho, quais eram os objetivos a atingir na disciplina de Física e Química A, me respondia “não sei ‘stôra! A minha mãe diz que para ir para o que eu quero tenho de tirar um 19”. Naquele momento uma sirene soou no meu cérebro e perguntei “Mas qual o curso que queres José?”, imediatamente e sem pensar “o único que tem saída é Medicina”.
Fiquei instantaneamente a perceber que o José não queria ser médico e no decorrer da explicação apercebi-me que os pais eram médicos e ele sentia a pressão social e familiar para seguir o caminho dos pais. Ao longo do ano, fui tentando perceber quais eram verdadeiramente as paixões dele: Música e Astronomia. Era isto que ele mais gostava. Disse-lhe para ter uma conversa aberta com os pais. Que eles iriam compreender que em vez de ir para Medicina, o sonho dos pais, teria de seguir o seu próprio sonho – a Física. Na quarta-feira realizou o exame de Física e Química A e sei que em Setembro estará matriculado no curso que ele tanto queria mas que não sabia.
Por este mundo fora há muitos José, filhos que vivem os sonhos dos pais e que ao longo da vida se frustram com a escolha que outros fizeram por eles. Bem sei que nenhum pai quer o mal dos filhos e que muitas das vezes que “sugerem” um caminho é para tentar amparar as quedas dos filhos. Mas não nos podemos esquecer que é a tropeçar que começamos a andar e que ninguém corre sem dar os primeiros passos.
O inverso também acontece. Pais que menosprezam os filhos e que, mesmo publicamente, os humilham e os rotulam como “ele é um burro” ou “ele tira negativas porque sai ao pai dele!”. Sim, infelizmente já ouvi estas duas frases.
Mas nem sempre as crianças/adolescentes são o alvo, algumas – muitas aliás – das missivas por parte dos pais são mesmo para os professores/educadores. Muitos dos adultos comportam-se como autenticas crianças: desafiando sistematicamente os professores e recusando que os seus filhos podem ter alguns comportamentos menos próprios, convencendo-se que têm em casa “Deuses na terra”.
Em relação também à intromissão na vida da escola de forma abusiva, os pais tendem a impor as suas rotinas e hábitos na escola. Isto acontece mais no pré-escolar. Na sala do meu filho mais velho, a Educadora implementou uma dinâmica de relaxamento. Confesso que, o meu filho gosta, mas no início fiquei surpreendida com a iniciativa. Não é de todo usual este tipo de explorações numa escola e questionei o porquê de tal acontecer. Amávelmente explicou-me as razões para o fazer e agora, acho que todos os meninos beneficiam desse momento e alguns podem fazer uma pequena sesta.
Outra das medidas recorrentes sobretudo no ensino privado é a “compra da educação/formação”. “Se o meu filho não passar, tiro-o deste colégio”, “Para que o meu filho anda num colégio se tira negativas?”, “Não te sabes comportar? Ando a pagar tanto dinheiro para te comportares assim?”. Podia estar quase um artigo inteiro a debitar frases, interjeições e desabafos que oiço diariamente. (E muitos deles com os próprios filhos presentes, demonstrando a fragilidade do sistema e a falsa hierarquia do poder monetário – que o dinheiro compra e pode tudo).
Claro que é necessário os pais estarem presentes na vida académica dos seus filhos. Questionar, de forma educada, é sem dúvida a melhor abordagem. Pais que se preocupam com o futuro dos seus filhos terão filhos mais agradecidos no futuro, não tenho dúvidas disso.
Agora, é preciso fazê-lo com contra-peso e medida. Pois é urgente que a escola seja reformulada e só o conseguimos juntos. É urgente que se respeite os timings dos alunos, que se respeite os professores e sobretudo que haja simbiose entre a escola e a família. Porque os nossos filhos são o futuro do mundo, porque o realmente importa é que eles sejam felizes e realizados com o que são.
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