Não oferecer prémios, recompensas nem castigar tem como objetivo promover a auto-motivação e auto-disciplina da criança, em que esta desempenha as tarefas por sua própria satisfação, e não para conseguir um prémio ou evitar um castigo. Situações estas muito faladas no behaviorismo, quando recorrem ao reforço e punição.
Mas então e quando as crianças fazem algo “mal”?
Em vez de castigos utilizamos consequências, ainda que possam ser parecidas, enviam mensagens diferentes.
O castigo é algo imposto de maneira externa, enquanto a consequência é algo que vai associado de forma natural à ação em questão.
Por exemplo… Ao fim da tarde chegamos a casa, depois de um dia de trabalho e enquanto preparamos o jantar as crianças brincam. De repente chegamos ao quarto dos brinquedos para as chamar para o banho, e na mesa, encontramos uma bela obra de arte digna de “Picasso”, como reacionamos?
“Vais de castigo para o teu quarto e não voltas a pintar com as canetas durante uma semana.” (Castigo que impomos e que é arbitrário)
“Se cada vez que usas as canetas pintas toda a mesa, brincas menos tempo pois tens toda a mesa para limpar” (Consequência direta da sua ação)
Da mesma forma que se queremos recompensar/premiar um bom comportamento, devemos ter atenção à forma de o fazer de modo a evitar “dependência” de certos tipos de respostas ou reações perante uma determinada ação. É assim importante que a criança se sinta responsável pelas suas opções e comportamentos, percebendo a “recompensa” como inerente á ação que a originou, o que por vezes se consegue unicamente com pequenas alterações ao nível da linguagem.
É normal um certo caos na hora de deitar, pois a maior parte das crianças passa o dia sem os pais, e quando literalmente “nos apanham” não querem ir dormir, demoram a pôr o pijama, o lavar os dentes é eterno, e querem sempre mais uma história…como podemos reagir perante esta confusão? Claramente estar mais tempo com eles desde que chegamos a casa pode ajudar, envolvê-los nas tarefas de pôr a mesa, preparar o jantar, preparar as mochilas para o dia seguinte, a roupa etc e na rotina de preparação para dormir torna-los responsáveis pelo seu tempo!
Por exemplo: “Se pões o pijama, lavas os dentes e te preparares para dormir rapidamente, deixo-te ler uma história antes de ir para a cama” (a criança percebe esta situação como uma recompensa)
“Se pões o pijama, lavas os dentes e te preparares para dormir rapidamente, terás tempo de ler uma história antes de ir para a cama” (a criança vai perceber a situação como uma consequência lógica do seu comportamento, pela qual ele é responsável).
A diferença ainda que subtil, é muito importante.
Em relação aos castigos, quando castigamos as crianças por algum comportamento, não favorecemos a autodisciplina, a motivação intrínseca, nem permitimos que as crianças sejam autónomas e responsáveis. Pois somos nós a julgar os comportamentos da criança e a classifica-los, assim a criança não tem de o fazer, não tem de refletir sobre o seu comportamento, não assume o erro nem se responsabiliza por ele.
Os limites existem pois são o instrumento da sociedade para manter a liberdade de cada um, e como pais e educadores cabe-nos a tarefa de os partilhar com os nossos filhos/educandos, seguindo a máxima de Jean-Paul Sartre que afirma que a minha liberdade termina quando começa a do outro.
Jane Nelsen questionava, de onde tiramos a ideia de que para que as crianças melhorem, devemos fazê-las sentir-se mal?
As consequências são algo natural, e num ambiente Montessori é assim que acontecem, quando derramamos água ou qualquer substância apanhamos, se sujamos a mesa na hora da refeição limpamos, e lavamos o pano para que esteja pronto para que a próxima pessoa que necessite o possa usar….
Mas e se por exemplo as crianças não querem recolher os brinquedos ou materiais?
Dependendo das idades das crianças, mas com as crianças mais pequenas funciona muito bem chegar a um acordo e trabalharmos em equipa, recolhemos os brinquedos juntos, ou quando são maiores criar a regra de que só podemos brincar com um segundo brinquedo, quando o primeiro estiver arrumado, e todos devemos respeitar esta regra de boa convivência. Muitos conflitos acabam por surgir pela incoerência das consequências, quando não são naturais.
Assim é importante gerir as situações de conflito de forma empática, ouvindo a criança, permitindo que manifeste o que sente, mostrar-lhe que compreendemos o que esta expressa e com toda a calma acordar algo a criança ou relembrar as regras em casa. Importante ser capaz de não julgar, não pensar que nos estão a desafiar, não é uma situação pessoal, simplesmente os desejos e expectativas que a criança e o adulto têm são diferentes, e é importante ser capaz de chegar a um entendimento.
Estes serão os modelos que eles vão ter de como resolver conflitos com outros!!
Dai ser importante mantermos uma conexão, e falarmos desde o coração, por mais cansados que estejamos, por menos paciência que tenhamos e com a noção de que nem sempre vamos ser capazes de fazer exatamente como queremos, mas ter a humildade de reconhecer que erramos, e procurar fazer melhor cada dia.
Por outro lado os prémios ou recompensas são o lado oposto dos castigos, e há investigações sobre processos mentais levados a cabo no behaviorismo, demonstraram que só o uso de castigos não é eficaz, é necessário completá-los com prémios/recompensas, para que o método tenha sucesso.
Os prémios e os castigos não favorecem o trabalho espontâneo inerente ao desenvolvimento da criança, mas sim condicionam e suprimem esta espontaneidade, pois perante estes, as crianças inibem o comportamento com receio de castigos e atuam esperando recompensas. Nas escolas Montessori as crianças são livres para escolher o seu caminho, o seu trabalho, as suas atividades, e são responsáveis pelas suas ações, sendo capazes de seguir o seu guia interno com espontaneidade, atender aos seus períodos sensíveis, seguir a sua motivação intrínseca e se autodisciplinar. E nestas condições, as crianças são absolutamente indiferentes a prémios e castigos!
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